Morre o Cineasta FRANCISCO CAVALCANTI, um Valente da Sétima Arte Paulistana
Morreu aos 72 anos na madrugada desta 4a. feira, 1o. de Outubro, em meio ao tratamento de um cancer do intestino, o reconhecido cineasta FRANCISCO CAVALCANTI, um dos ícones da chamada “BOCA DO LIXO”
Ator, Roteirista, Produtor, Diretor, FRANCISCO CAVALCANTI, nascido na cidade de Poá, na Zona Leste da região metropolitana de São Paulo começou sua carreira no Rádio em Mogi das Cruzes (Rádio Marabá), logo migrando para o cinema. A partir de então, através de seus estúdios no Bairro do Brás, na Rua Firmiano Pinto, desenvolveu vários projetos e iniciou muitos atores na cena cinematográfica paulistana.
Cartaz do Longa “O PORÃO DAS CONDENADAS”, um sucesso de Francisco Cavalcanti
Francisco Cavalcanti, com poucos recursos, produziu, dirigiu e estrelou um total de 21 filmes, todos com temática policial, geralmente tendo como cenário o centro velho de São Paulo, região da Rua do Triunfo até a famosa esquina da Av.São João com a Av.Ipiranga , ou seja, a própria chamada “BOCA DO LIXO”. Chico sempre aparecia como o justiceiro, defendendo jovens exploradas, resolvendo tudo a bala. Seus filmes tinham grande aceitação na região e na periferia de São Paulo.
Assista cenas do longa metragem MULHERES VIOLENTADAS, um grande sucesso estrelado por Francisco Cavalcanti e Helena Ramos, clicando aqui
Filmografia:
1988Aberrações de Uma Prostituta
1987Horas Fatais
1986A Hora do Medo
1986O Papa Tudo
1984Animais do Sexo
1984Padre Pedro E a Revolta das Crianças
1984Sexo, Sexo, Sexo
1983O Cafetão
1983Os Tarados
1983Os Violentadores de Meninas Virgens
Vi um trecho retirado do “O porão das condenadas” e teria sido um rolo de filme bem melhor aproveitado se ao invés de fazer um filme exaltando a perversão tivesse registrado detalhes da época como o belíssimo Ciferal Dinossauro da Viação Cometa (que aparece no filme como coadjuvante), o Corcel novinho, o trânsito em geral, etc. Querer é poder, e de “boca do lixo” em “boca de lixo”, a sociedade acaba desviando-se in corpora para a degradação por pequenas coisas como esse filme. Basta verificar como anda setores do centro de São Paulo – como a própria Rodoviária Julio Prestes que aparece na obra – que local de utilidade pública, hoje, virou cracolândia.
Caro Silvio, do “Veteranos da Estrada”: Grato pela visita e por comentar a matéria!!!
O gênero em que o Cavalcanti apoiou a sua paixão pela arte cinematográfica, que ficou taxado pela alcunha simplista de “pornochanchada”, realmente merecia muitos senões, em vários aspectos. Porém, não creio que foram os valentes cineastas da Rua do Triunfo os fundadores de sua própria condição de produtores de cinema de duvidoso valor cultural. Segundo ouvi da boca do próprio Cavalcanti, um sujeito simples, para não dizer simplório (o que só faz aumentar a admiração por seu trabalho), no avant-premier do seu “Porão” em 1979, o sistema exibidor exigia o nu nas películas do pessoal da boca do lixo, senão, não aceitavam exibir os filmes, e, para cumprir a lei de cotas que obrigava as salas a programaram produções nacionais, se não me engano, em 183 dias por ano, iam atrás de produções antigas. Ademais, não foram os cineastas da boca do lixo paulistana – Cavalcanti, Clery Cunha, Toni Vieira, o próprio Davi Cardoso, e o Zé do Caixão, e vários outros que agora não me recordo os nomes – os idealizadores da cracolândia: eu mesmo, trabalhando em escritórios no centro velho de São Paulo, morei na boca do lixo paulistana (Praça Júlio de Mesquita, Rua Barão de Limeira, Rua Cons. Nébias, Av.Ipiranga, foram meus endereços por anos), em hotéis e prédios antiqüíssimos, edifícios com fama de “treme-treme”, vizinho de artistas de rua, prostitutas, mascates, trambiqueiros de todo tipo, travestis e contrabandistas, peguei muito ônibus para o interior na hoje demolida rodoviária, peguei muito trem na estação Júlio Prestes, andei em meio às senhoras do Parque da Luz, comprei muita coisa na Galeria Pajé, peguei muita condução no Largo Paissandu, almocei muito bife à cavalo, muito omelete, nos restaurantes populares das galerias da Dom José de Barros, 24 de Maio e São João, passei muitos natais em meio aos moradores típicos da região central da São Paulo que eu amo, desde bandidinhos de bairro até, segundo dizem, verdadeiros gangsteres. Segundo depreendi de várias conversas travadas por anos com diferentes moradores antigos dali, a “boca do lixo” já existia há décadas, provavelmente desde antes do início do Séc.XX, e sua vocação para depósito da miséria humana é antiga. Na Av.São João, indo para as Ruas Timbiras, Pedro Américo e Aurora, como parte de minhas tarefas no centro da cidade, em plena 1 hora da tarde, cruzava com grande quantidade de prostitutas decadentes todos os dias, e isso não foi criação dos cineastas da Rua do Triunfo, antes, eles eram simplesmente um subproduto de tudo isso.
Quanto ao Francisco Cavalcanti, fazer longas metragens no Brasil nos anos 1970 realmente era tarefa hercúlea sob vários aspectos, e esse homem iletrado, sem cultura, sem dinheiro, empreendia nessa área como podia, ele e vários outros idealistas da 7ª. arte da época. Visitei-o uma vez em seu estúdio na Rua Firmiano Pinto, na divisa do Brás e Belenzinho, e eu, na época um rapazola de 20 anos, universitário tímido, não conseguia compreender o contraste: fazer cinema e ser tão simplório, sem recursos, ainda contando com atores sem o menor preparo para a tarefa. Ainda assim, se fazia cinema!!! Usando o sistema de cooperativa, aqueles valentes juntavam um recurso daqui, outro dali, outro de acolá, emprestavam dinheiro de agiotas perigosos, vendiam o Chevette, o Aero-Willys, a Variant, e se faziam os filmes, COMO DAVA PARA FAZER!!! Embrafilme? Kkkkkk… (Isso era lá com os Faria, com os Massaíni, Coimbra e afins). Editais? Kkkkkkkkkkk… Apoio público de qualquer natureza? Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk….
Na verdade, até hoje, fazer cinema paulistano é entrar em algum tipo de setor marginal, imagine nos anos 1970! Por essas e outras, hoje eu sei que os cineastas da boca do lixo paulistana ERAM HERÓIS DE VERDADE!!!
Valeu!
Wagner Woelke